De acordo com a historiadora Thereza Maia (2021), tifo é doença contagiosa, com sintomas como febre, dor de cabeça intensa e exaustão extrema, cujo micróbio foi descrito em 1882. Hoje possui vacina e é curada com antibióticos. Era chamada “doença das mãos sujas”, com vários sintomas intestinais. É transmitida por água contaminada e esgotos “a céu aberto”.
Era muito comum nos séculos passados, tendo a filha do presidente Conselheiro Rodrigues Alves, Guilhermina, falecido de tifo aos 15 anos, bem como outras vítimas, na área central da cidade, como nas ruas Rafael Brotero, Pedro Marcondes e Frei Galvão, então considerados locais onde o tifo costumava aparecer.
Por essa época, foi construída uma “casa de isolamento” no local onde hoje fica a escola estadual “Joaquim Vilela de Oliveira Marcondes”, no bairro Nova Guará, afastada do centro da cidade e para onde passaram a ser levados os doentes que deviam ser isolados.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / Referências: MAIA. Thereza Regina Camargo. Guaratinguetá e as epidemias. 2021 / Foto do blog: rafaelamolina.blogspot.com
Os presépios, apesar de estarem enraizados na tradição católica cristã, fazem parte da diversidade cultural e das manifestações de uma data comemorada em quase todos os países do mundo, que é o Natal.
O primeiro presépio do mundo foi montado em argila por São Francisco de Assis, em 1223. O costume espalhou-se por entre as principais catedrais e igrejas europeias na época da Idade Média. Em 1567, a duquesa de Amalfi teria mandado montar um presépio, que tinha 116 figuras, para representar o nascimento de Jesus. Após o fato, a partir do século 18 foi iniciado o costume europeu de construir presépios.
Na região do Vale do Paraíba, um viajante estrangeiro, como Spix e Martius, em sua obra “Viagens pelo Brasil”, de 1817, que relatava as características do Brasil colonial, registrou que os presépios natalinos eram comuns nas igrejas e praças públicas. O maior exemplo dessa prática natalina era o Convento Franciscano de Santa Clara, em Taubaté, que possivelmente foi o centro radiador dessa tradição e se espalhou para as cidades vizinhas.
Aqui em Guaratinguetá, de acordo com os cronistas e memorialistas da cidade, os presépios se tornaram também uma tradição de exposição nas casas dos moradores para, assim, manterem viva essa tradição tão milenar.
Na nossa cidade há um casal que mantém viva essa cultura dos presépios: Antonino e Maria da Glória Kimaid, que durante suas viagens ao exterior tiveram a ideia de colecionar presépios também de outros locais, como os trabalhos dos africanos, antiga Tchecoslováquia e de uma tribo indígena canadense. No ano de 2015 houve uma exposição por meio da ação da Secretaria de Cultura em que foram expostas as diversidades culturais dos presépios natalinos.
No ano de 2015 houve uma exposição por meio da ação da Secretaria de Cultura em que foram expostas as diversidades culturais dos presépios natalinos.
A exposição dos presépios natalinos é uma representação da cultura e tradição cristã católica, tão característica em nossa cidade.
Preservar essa tradição não é somente celebrar a fé de uma determinada instituição religiosa, mas celebrar o arquétipo da vida, nascimento, doação, esperança e o espírito de caridade tão necessário para a preservação da nossa vida em sociedade.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / Referência https://jornalatos.net/regiao/cidades/guaratingueta/com-quase-900-presepios-casal-de-guaratingueta-realiza-exposicao / Arte: @vanessamarins1 / Os acervos de presépios do Dr. Antonino Kimaid.
Era um final de semana no interior do Estado de São Paulo. Um francês, chamado Georges Simon Ligot, que nasceu em 1922 em Lognes, avistou as terras em que havia um belo bairro próximo ao Clube dos 500, e ficou impressionado com os paturis (pequenos patos) que andavam no local. A história e a saga desse chefe francês que dimensionou Guaratinguetá e a culinária francesa na nossa região, e até mesmo no Brasil, foram contadas pela sua filha Fabienne Ligot.
Sua história e sua ligação com o Brasil aconteceram quando deixou a casa de seus pais no ano de 1949 para trabalhar em Paris no Hotel e Restaurante La Perousé, e num dia comum de trabalho, houve um empresário brasileiro que perguntou ao dono do restaurante: ‘Quem fez essa comida? Quero conversar com o chef’.
"Papai estava todo nervoso e preocupado pensando que haveria reclamação da comida, mas simplesmente foi escutar o casal brasileiro.
E assim, o empresário disse: ‘Eu gostei muito da sua comida, tenho uma proposta para você. Eu sou brasileiro e estou abrindo um restaurante francês na cidade do Rio de Janeiro. Se você quiser trabalhar em meu restaurante, dou-lhe emprego, casa e tudo o que você precisar. Sua comida é muito boa. Eu sugiro que você faça um teste, e se você gostar, leva sua esposa para ficar definitivo’.”
Georges não sabia onde era o Brasil, muito menos a cidade do Rio de Janeiro, porém, passaram-se três dias e ele aceitou a proposta.
Antes de sua chegada ao Brasil, Fabienne ainda conta sobre a sua juventude, as dificuldades na sua infância e a participação de seu pai na Segunda Guerra Mundial.
Em um dos relatos, Mr.Ligot contava emocionado à sua filha como foi salvo entre as batalhas, prisioneiro dos alemães, em que estava desfalecendo de tanta fraqueza, e que do nada apareceu um soldado e lhe deu um pequeno pedaço de açúcar. Isso lhe devolveu a vida. A princípio, ele imaginava que era um soldado norte-americano, mas depois descobriu que também era francês.
Como citado, Ligot nunca teve vontade de retornar à sua terra natal; caso fosse, seria para agradecer ao amigo, soldado e conterrâneo.
Quando criou seu próprio restaurante em Guaratinguetá e sua cozinha francesa, teve tanto sucesso que foi seu universo até o último dia de sua vida.
Outro fato importante de sua trajetória e que não podemos esquecer, é sobre a esposa de Ligot, Madeleine Ligot, que sempre estava ao seu lado. Ambos tinham personalidades fortes e parecidas, mas quando a situação apertava, estavam sempre unidos.
Fabienne relata que sua infância foi também ao lado de seu irmão, Gaetan Ligot, formado chef na França. Gaetan trabalhou muitos anos ao lado do pai no Paturi. Hoje está aposentado, vivendo na França.
Sobre a vinda de Ligot para Guaratinguetá e a realização de seu próprio negócio, foi quando um amigo, Jean Dupret, que havia conhecido no navio perguntou a ele: ‘Por que você não abre seu próprio restaurante?’ Jean já havia trabalhado no Clube dos 500 como chef, e disse que conhecia a alta sociedade que apreciava a culinária francesa.
Assim, no ano de 1955, Ligot veio a Guaratinguetá e começou a realizar o sonho de seu próprio restaurante, no início pequeno e com poucas mesas no bairro São Bento, e o nome Paturi foi em homenagem à sua primeira impressão sobre os patos que andavam na região.
Seu carro-chefe era o famoso canard a lorange, o pato com laranja. Com os negócios prosperando em 1960, Mr.Ligot expandiu também um hotel chamado Hotel e Restaurante Paturi, agora na rodovia Presidente Dutra.
Seu hotel e restaurante tornaram-se parada obrigatória para os que transitavam entre São Paulo e Rio de Janeiro.
Vários jornais da época elogiavam e indicavam o famoso pato com laranja do brilhante chef francês.
Sua culinária fez sua família vivenciar histórias, pois não havia divisão entre o hotel, o restaurante e sua casa, e conhecer pessoalmente várias personalidades, entre políticos e artistas, que vinham especialmente conhecer a tão saborosa culinária francesa na região.
Fabienne relata que uma das personalidades que mais chamou sua atenção foi o presidente na época, Costa e Silva, e sua entrada marcante durante a ditadura militar. E comenta: “Eram vários carros, uma comitiva para a sua chegada, e eu nem imaginava quem era, soube mais tarde ao pesquisar”.
E não só presidentes e políticos visitaram e usufruíram do principal e famoso prato e referência de sua cozinha, o pato com laranja, mas artistas, escritores, apresentadores e grandes personalidades públicas, como Renato Aragão, Fátima Bernardes, Regina Casé, Chico Anísio, Carlos Zara e Eva Wilma, o ator e diretor Marcos Paulo, Edson Celulari, os cantores Chico César, Daniel, Maria Rita, Sérgio Reis, Paula Toller, Guilherme Arantes, Oswaldo Montenegro, Emílio Santiago, Pery Ribeiro, os apresentadores Gugu Liberato e Chacrinha, o chef francês Olivier, a família real Orleans e Bragança, o atleta João do Pulo, Caetano Veloso, Jorge Amado, Elis Regina, os políticos Fernando Henrique Cardoso, Delfim Neto, entre tantos outros.
Fabienne guarda um precioso registro das visitas ao Paturi: o livro de ouro, que contém as assinaturas das personalidades que prestigiaram a culinária de Mr.Ligot.
O Restaurante Paturi encerrou suas atividades em maio de 2019. Em razão da pandemia, finalizou vários empreendimentos que traziam prestígio à nossa região. Já o hotel ainda continua com suas atividades.
Tantas histórias e vivências por meio do chef francês que se apaixonou por Guaratinguetá e fez deste local sua vida e legado. Ele faleceu em 2017, aos 95 anos, e seguiu até os últimos dias trabalhando naquilo que fazia seus olhos brilharem. Deixou, por meio de sua culinária, um pouquinho da França em nossa região.
Texto e pesquisa: Marina T. F. C. Pinto / Foto: Madeleine Ligot / Arquivo pessoal de Fabienne Ligot.
Elizabeth Marino (Betina) nasceu em Guaratinguetá, no dia 4 de outubro de 1899 e faleceu em Pouso Alegre (Minas Gerais), em 13 de dezembro de 1975.
Fez o curso primário no Grupo Escolar Flamínio Lessa, ingressou na Escola Normal de Guaratinguetá, em 1916. Iniciou o magistério numa escola de Paraibuna. Em Guaratinguetá foi professora de português no Colégio Nossa Senhora do Carmo. Em 1934, assumiu as cadeiras de Psicologia, Sociologia e História da Educação, na Escola Normal de Guaratinguetá. Foi professora particular de francês e português.
Poetisa desde a adolescência, nunca deixou de escrever versos. Dotada de memória prodigiosa, registrou, em crônicas admiráveis, fatos da vida social de Guaratinguetá nas primeiras décadas do século. Católica fervorosa, militou em obras de apostolado e ação social, sendo Terceira Franciscana. Colaborou em todos os jornais de Guaratinguetá, sendo colaboradora permanente do Jornal “O Eco”. Escreveu para a Revista “Vozes” de Petrópolis, para “Ecos Marianos” de Aparecida e para “Ecos Seráficos” do Rio de Janeiro. Foi membro da União Brasileira de Escritores, do Centro Cultural “Eduardo Prado”, da Sociedade “Frei Galvão” e de outras instituições culturais.
Há uma rua no bairro Parque São Francisco e uma biblioteca da escola municipal Emefi Guilherme Eugênio F. Fernandes em sua homenagem.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / Referência:"Salto de Vida - poesias e crônicas"
Assim como o Brasil é rico em sua diversidade cultural, entre elas, a religiosa, Guaratinguetá contribui nesse processo. Apesar da nossa cidade e região vivenciarem uma forte tradição católica, o protestantismo e o evangelismo, assim como outras vertentes religiosas, também firmaram profundas raízes na nossa cultura e cotidiano.
Um dos exemplos dessa religiosidade é a igreja “Assembleia de Deus”, que chegou ao Brasil por intermédio dos missionários suecos Gunnar Vingren e Daniel Berg, que aportaram em Belém, capital do Estado do Pará, em 19 de novembro de 1910, vindos dos Estados Unidos. São um dos primeiros pentecostais. A Igreja se posiciona como congregação de fé, serviço e adoração, onde o principal objetivo é proclamar o Evangelho de Cristo e promover, espiritual, moral e socialmente, o povo de Deus.
Aqui em Guaratinguetá, de acordo com o site institucional da Assembleia de Deus, o primeiro culto foi realizado nos meados do ano de 1924, em frente ao Mercado Municipal, na esquina da rua Dr. Martiniano com a Nove de Julho. O grupo que efetuava o culto era composto por quatro pessoas; os presentes cantaram o hino “Olhai para o Cordeiro de Deus”, atualmente o de número 20 da “Harpa Cristã”.
Dessa data em diante, foram realizados cultos no mesmo local, porém, com grandes intervalos.
No limiar do ano de 1932, esses cultos foram mais frequentes, e, aos poucos, realizados em casas dos novos convertidos. Por esta época chegaram da cidade do Rio de Janeiro, através da Assembleia de Deus, em São Cristóvão, o missionário inglês, Walter Goodband, e sua esposa, a irmã Elizabeth; e a irmã missionária sueca, Ester Yolanda, com evangelismo mais intenso e administrando o grupo de fiéis.
Os primeiros a se converterem em Guaratinguetá foram: irmã Balbina Pinto e seus filhos José e Sebastião; João Agostinho, Joaquim Corrêa, a família Reis, irmão Inácio e irmã Rosa Cândido.
Quando a congregação já estava com um bom número, foi alugado um salão na rua Visconde de Guaratinguetá, 529, onde foi organizado como igreja no dia 25 de janeiro de 1935, passando depois para a rua Padre Inácio, 48, em 24 de julho de 1945, tendo seus estatutos registrados no foro desta cidade, sendo sua primeira diretoria assim constituída.
O primeiro batismo nas águas foi realizado no Rio Paraíba, próximo ao Orfanato do Puríssimo, no bairro do Pedregulho. Nele foram batizados seis neoconversos.
A igreja, inicialmente, era pastoreada pelo pastor Delfim Anacleto do Prado, sob a supervisão do missionário Walter Goodband, durante as décadas de 1940 a 1950.
Em 6 de setembro de 1983, o Templo Central passou a situar-se na rua Coronel Pires Barbosa, 485, no bairro Campo do Galvão, condizente com a nova razão social “Assembleias de Deus com Sede em Guaratinguetá”.
Muitas histórias foram e são transmitidas ao longo da História, e as manifestações religiosas são componentes essenciais para compreendermos o homem no tempo, no espaço, seus valores e a cultura no cotidiano e hábitos, ou seja, fazendo a história.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / Referência: https://www.infoescola.com/religiao/igreja-evangelica-assembleia-de-deus-iead/ https://www.adguaratingueta.com.br/assembleiadedeus/ / Fotos retirados do site institucional sobre o primeiro batismo e o início da construção no bairro Campo do Galvão.
Orozimbo Otávio Roxo Loureiro nasceu em Jaú (SP) no dia 4 de setembro de 1913. Realizou sua formação no tradicional Colégio São Bento, em São Paulo, de 1925 a 1929. Ingressou na Faculdade de Medicina, a qual concluiria em 1936.
Em 1937 fundou a empresa de transportes Auto Viação Americana e foi diretor comercial da Rádio Sociedade Fluminense de Niterói.
Foi também diretor da Companhia Moreira de Padronização, de Campinas, em 1941, e da Empresa Paulista de Imóveis, em 1942. Após formar-se em 1946 pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, promoveu a reestruturação do Banco Nacional do Comércio do Rio de Janeiro em 1950, e a incorporação do Banco Nacional do Paraná e Santa Catarina em 1952.
Elegeu-se deputado federal por São Paulo no pleito de outubro de 1954 na legenda do Partido Republicano (PR), em coligação com o Partido Social Democrático (PSD).
Foi diretor da Associação Comercial de São Paulo, participou da reorganização da Companhia de Seguros Aliança Brasileira e foi presidente da Companhia Pan-Americana de Hotéis e Turismo, promovendo ainda a criação do Fundo de Investimentos em Participação. Foi também fundador e presidente da Roxo Loureiro Banqueiros de Investimentos e de outros ramos do setor bancário.
Casou-se com Nilza Dias Roxo Loureiro, com quem teve quatro filhos.
Publicou vários livros como: Um aspecto da dívida externa brasileira; Bancos, instituições para servir o público; Por que acredito no Brasil; O petróleo nacional e a democratização do capital; A reforma do sistema bancário brasileiro, Companhias de investimentos e sua autobiografia Garimpando Reminiscências.
Porém, a grande obra de sua estima criativa e afetiva foi a realização do moderno bairro localizado entre São Paulo e Rio de Janeiro na rodovia Eurico Gaspar Dutra, o Clube dos 500.
No período de realização da magnitude de sua obra, convida profissionais notáveis do campo artístico e arquitetônico, como Niemayer, Burle Marx, Di Cavalcanti, entre outros, fazendo Guaratinguetá participar ativamente do processo de modernização que o Brasil vivenciava.
Ao se afastar de suas atividades bancárias, o Clube dos 500 era seu pouso de recolhimento para escrever sua autobiografia.
Faleceu no dia 22 de outubro de 1979, em São Paulo, em consequência de infarto fulminante enquanto conversava com seu amigo Amador Aguiar. Está sepultado junto de seus pais na cidade de Lorena.
E nos deixa sua obra de valiosíssimo primor e generosidade: o seu amado Clube dos 500 e seu legado de arte, cultura, arquitetura e a esperança de uma cidade moderna.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / Referência: CANETTIERI. Ana Cristina. No meio do caminho. Clube dos 500. Editora Casalua, 2018. / http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/loureiro-orosimbo-roxo. / Bico de pena realizado por Rafael Quito. / Retrato de Orozimbo Loureiro aos 40 anos de idade.