A história lendária da montanha de prata e ouro nos remete aos pontos de vista e o que consideramos como valiosos.
No século XVI, enquanto os europeus desbravavam as terras do Vale em busca dos metais preciosos, os nativos indígenas percebiam como valioso tudo que reluzia como o sol, a água, a montanha iluminada pela manhã.
Um relato mais detalhado é encontrado no maravilhoso trabalho do professor Benedito Carlos Marcondes Coelho, em sua obra “A História de Guaratinguetá no período colonial”.
Segundo o professor, em 1591 chega ao Brasil o governador geral, d. Francisco de Sousa, que vem para a Bahia. Na Europa corriam lendas fantásticas afirmando que aqui havia cidades de ouro, lagoas douradas e montanhas de prata. Isto começou a animar a ambição dos portugueses.
D Francisco de Sousa recebe a missão de encontrar uma serra lendária, montanha de prata, que os indígenas afirmavam existir em nossa região na capitania de São Vicente, atual estado de São Paulo e em específico no Vale ou a Mantiqueira. Na época, a região do Vale era conhecida como SABARABOÇU, ou seja, a montanha cheia de ouro e prata.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / A Vila de Jacarehy no início do século XIX. Tela de Jean-Baptiste Debret / Retirado: pinacotecadovale.blogspot.com.br
Os primeiros habitantes de Guaratinguetá foram os indígenas puris e também os primeiros habitantes da região do Vale que se estendia até o atual Estado do Espírito Santo.
Os indígenas puris eram considerados pacíficos e mansos pelos portugueses, porém, quando enfurecidos, tornavam-se vingativos, não esquecendo uma ofensa.
Outro relato é que os puris habitavam desde o sertão de Guaypacaré, onde se levantaria Lorena, porém, com a invasão dos europeus, muitos recuaram para a Mantiqueira.
Assim, as tribos e a cultura indígena foram aos poucos se dividindo.Entretanto, percebemos que a relação dos indígenas que aqui habitavam e o desbravamento dos bandeirantes portugueses que se deslocaram aproximam-se dos relatos do início da pré-colonização brasileira, em que nativos e europeus vivenciaram contrariedades e um choque cultural devido às diferenças em relação ao cultivo da terra.
Independente de uma história de vencedores e vencidos, a construção cultural de nossa cidade se formou pela fusão indígena e europeia. Vários exemplos temos na nossa culinária e nomes de origem indígena, como nomes de cidades: Guaratinguetá, Pindamonhangaba, Caçapava, Taubaté.
Na nossa culinária: paçoca, cará, inhame, mandioca; de animas: tatu, sagui, tamanduá, anta, capivara, entre outros exemplos.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / Obra: A dança dos puris. Jonh Baptiste Von Pix. Viagem pelo Brasil( 1823- 1831).
São Benedito é um santo muito especial e homenageado em nossa cidade. A tradição de reverenciá-lo já é antiga e caminha com a construção cultural de Guaratinguetá. Conhecido como o Santo Negro, inicialmente era cultuado pelos escravizados e pela sua popularidade começou a ser reverenciado como o santo da fartura e dos cozinheiros.
Benedito Manasseri nasceu em 1526, na Itália. Era filho de africanos escravizados. Aos 21 anos, ingressou entre os eremitas da Irmandade de São Francisco de Assis.
Ele, exercia a função de cozinheiro como irmão leigo e analfabeto, mas a sua sabedoria fez com que os superiores o nomeassem mestre de noviços e, mais tarde, foi eleito o superior do Convento. Morreu, no dia 4 de abril de 1589, com grande fama de santidade. Até os mais ricos o procuravam para o seu aconselhamento. Foi canonizado em 1807, pelo papa Pio VII. Em 1652, já era o santo padroeiro de Palermo, mais tarde foi aclamado santo padroeiro de toda a população afro-americana, mas especialmente dos cozinheiros e profissionais da Nutrição.
Porém não podemos esquecer outro santo que faz companhia nos altares da Igreja da nossa cidade que é São Gonçalo. São Gonçalo de Amarante nasceu no final do século XII em Portugal. Era de família nobre e logo foi encaminhado para ter os primeiros estudos como um sacerdote. São Gonçalo era um ardoroso peregrino e viajante em depositar toda a fé nos túmulos dos apóstolos São Pedro e São Paulo, em Roma como em Jerusalém. Em suas viagens ergueu uma ermida sob a guarda de Nossa Senhora da Assunção e se recolheu ali como eremita. Mais tarde no mesmo local, fundou-se a igreja e convento de São Gonçalo, em Amarante. São Gonçalo gostava de cantorias e de rodas de viola, e a usava para propagar a Palavra de Deus. Ele é considerado, o Santo protetor dos ossos, dos tropeiros, violeiros e caminhantes. Em 16 de Setembro de 1561 ele foi beatificado. Uma curiosidade: Assim como Santo Antônio, ele é considerado santo casamenteiro, só que para as mulheres mais velhas e dos casamentos felizes.
Até hoje há certa dúvida sobre a atual paróquia do Puríssimo Coração de Maria ser popularmente conhecida como a Igreja de São Benedito e de São Gonçalo.
Primeiro iniciou-se a devoção ao São Gonçalo que de acordo com a historiadora Thereza Maia, a primeira capela foi construída pelos “homens do caminho”, como eram conhecidos os cavaleiros e tropeiros que passavam por ali”.
E como os tropeiros ou os homens do caminho não podiam cuidar e administrar de forma permanente a capela, pois faziam “comércio” nas estradas com seus cavalos e mercadorias, no ano de 1768, a capela de São Gonçalo foi entregue pelo Bispo de São Paulo aos irmãos de São Benedito com a condição de que zelassem pela capela que já necessitava de obras.
Em 1891 foi concedida pelo Bispado de São Paulo, autorização para que a Irmandade de São Benedito (que foi criada pelos antigos e ex-escravizados) construísse uma nova capela sob a invocação do santo”.
No dia 03 de abril de 1898 aconteceu a bênção e inauguração da Igreja de São Benedito. Aos poucos com a desativação da capela de São Gonçalo, sua imagem passou a fazer parte do alta-mor. Podemos observar na arquitetura interna da Igreja atual, além da imagem de Nossa Senhora como também dois altares para os primeiros santos homenageados: São Gonçalo e São Benedito.
Passando o tempo, já Guaratinguetá nos primórdios da República, em 28 de agosto de 1928 foi elevada a Paróquia, sob o título de Puríssimo Coração de Maria, a pedido e grande devoção do Monsenhor Filippo (que foi um grande construtor de patrimônios culturais e religiosos na cidade). Em 1940 assumiu como pároco Rodrigo da Silva Araújo que esteve à frente desta paróquia até o ano de 1991 e durante seu sacerdócio, a igreja foi demolida entre os anos de 1960 a 1970. Assim foi se configurando a arquitetura atual da Paróquia do Puríssimo Coração de Maria, mas sem deixar a devoção a São Benedito e São Gonçalo.
Nesse contexto da construção e reformas da igreja temos uma tradição bem característico da nossa região que é a Cavalaria de São Benedito e São Gonçalo, ou seja, um desfile tradicional em reverência aos dois santos que no domingo de Páscoa é um símbolo de devoção. Neste ano não teremos essa tradicional festa e cavalaria considerada como as 7 maravilhas de Guaratinguetá, devido a pandemia. Talvez rememorar as nossas tradições também pode ser um passo para construirmos um futuro melhor.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / Referências: https://www.portalr3.com.br/2018/09/guara-paroquia-purissimo-coracao-de-maria-celebra-90-anos/ http://turismoguara.blogspot.com/2010/04/sao-benedito.html / http://arquisp.org.br/liturgia/santo-do-dia/sao-benedito-onegro/ https://www.iquilibrio.com/blog/espiritualidade/cristianismo/sao-goncalo/ https:/circuito.sescsp.org.br/historias-da-cidade/2015/guaratingueta/falta-foto-uma-cavalaria-motivada-pela-fe/ Mariana Krauss
Em janeiro de 2021, o canal de streaming Netflix estreou uma série interessante e bem peculiar: "Cidade Invisível". Ela conta uma história cativante na cidade do Rio de Janeiro, trazendo para as telas do Brasil e do mundo as lendas e folclore brasileiro, hoje tão pouco divulgados. As nossas lendas e folclore são aspectos de nossa identidade cultural que merece ser rememorada. E dentro dessa diversidade cultural brasileira encontra-se Guaratinguetá e a região do Vale do Paraíba. Uma das lendas da nossa região chama-se Amantikir.
Conta a lenda de AmantiKir ou a serra da Mantiqueira, que o Sol se
apaixonou por uma formosa indígena e ela também se encantou por ele. E a Lua, enciumada, foi se lamentar com o deus Tupã que colocou uma imponente montanha sobre a indígena, aprisionando-a para sempre. Desde então, a índia chora dias e noites com saudades do Sol e suas águas enchem os veios da montanha, transbordando nos rios e cachoeiras que escorrem pela Serra da Mantiqueira. E por isso os tupis a chamavam de Amantikir, a montanha que chora.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / Referência: http://www.parqueamantikir.com.br/a-lenda-de-amantikir / Imagem: https://lerenard.com.br/blog/lenda-de-amantikir
Visconde de Guaratinguetá
Padre e Regente do Brasil, Antônio Diogo Feijó.
Nos dias atuais, há muitos debates sobre a importância da educação e da instituição escolar como fator essencial para a construção de uma sociedade mais justa e democrática, ou seja, através delas há a esperança de se formar bons cidadãos.
Tendo passado um bom tempo nos corredores e nos bancos escolares, criamos assim uma memória afetiva que influenciou direta ou indiretamente na nossa história coletiva e enquanto indivíduos.
Porém, ao longo dos nossos dias, acabamos não percebendo que a escola também tem um passado e uma história a nos contar. Ela nos deixa rastros e pistas que materializam a história local e de nossa cidade.
Primeiramente, a educação e a instituição escolar não eram um percurso para todos, somente a elite local tinha acesso ao conhecimento, e os professores eram contratados pelas famílias mais abastadas.
Alguns se reuniam em uma sala de suas casas e ministravam as suas aulas. Até conquistarmos a educação como direito fundamental da criança e do adolescente, foi um longo caminho a ser trilhado. Mesmo com a criação, em 1990, do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), sabemos de casos de crianças em algumas regiões sem acesso à escola próxima a sua casa, e hoje muito se discute também sobre a educação que é oferecida.
Já em Guaratinguetá, de acordo com as fontes documentais, o primeiro professor em que há registro em nossa cidade era chamado Manoel Gonçalves Franco (1742-1813).
O professor Manoel, quando se tornou viúvo, ordenou-se sacerdote. Educou o ilustre Visconde de Guaratinguetá (grande fazendeiro e um dos homens mais ricos durante o Império). Formou também o padre Antônio Feijó, que se tornou regente durante o Brasil Imperial, e cuidou pessoalmente da educação do que seria o futuro rei do Brasil, D. Pedro II.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / Referência: BARBOSA, Benedicto Lourenço. Subsídios à História da Educação na região de Guaratinguetá.s/d. / Ilustrações: retiradas do Wikipédia.
A rua homenageada dessa edição é a atual rua Comendador Rodrigues Alves.
Ele foi um grande empresário do café e indústria na cidade, era irmão do ex-presidente Rodrigues Alves.
Antes do seu nome atual, era chamada Rua do Porto, pois era a rua que levava ao Porto de Paraty os viajantes que aqui chegavam. Foi a primeira rua comercial de Guaratinguetá.
Entre 1700 até o final de 1800, atendia as vendas de suas mercadorias somente aos sábados, domingos e feriados. Aos poucos, o comércio foi se expandindo, e no início da República (1889 a 1930) ficou conhecida como a rua dos Comerciantes Italianos.
Atualmente é uma rua comercial e residencial.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / Referências: Giffoni, Marco.A Imigração Italiana em Guaratinguetá,1880 1930, 2003. / https://ihggguara.wixsite.com/ihgguaratingueta/imigracao-italiana-guaratingueta / Maia, Thereza Regina Camargo e Tom. Memórias do Comércio de Guaratinguetá.Ed.Comercial e Industrial de Guaratinguetá,1995.
Como no primeiro artigo da 1 edição, relatamos que as epidemias sempre fizeram parte da história de Guaratinguetá, que também sofreu as influências desse processo.
No ano de 1855, ainda no Governo Imperial e em plena economia cafeeira, a cidade vivenciou o surto da cólera. A cólera é uma doença causada por um microorganismo chamado vibrião colérico. Seus sintomas são: vômitos, diarréias, câimbras, arrepios e palidez.
De acordo com os dados históricos, já na Antiguidade da Grécia antiga, V anos antes de Cristo, a cólera já assolava as primeiras civilizações.
Em Guaratinguetá, segundo as atas da Câmara Municipal da época, recomendava-se para não disseminação da doença os seguintes hábitos: a caiação das casas e defumação com vapores de cloro ou de enxofre. Se houvesse um doente na casa, deveria lavar o assoalho com água de cal.
Caiação: pintura de cal nas paredes da casa.
Assoalho: piso de tacos de madeira muito comum nas casas do século XVIII.
Texto: Marina T. F. C. Pinto / Referência: FABIANO, Belinha Maia. A cólera em Guaratinguetá no século passado. ARQUIVO MEMÓRIA DE GUARATINGUETÁ-MUSEU FREI GALVÃO.1992